A 19 de Março de 2025, a Comissão do Mercado de Capitais (CMC) assinalou duas décadas de existência. Vinte anos marcados por tentativas progressivas de construir um mercado mais robusto, transparente e funcional, mas com desafios ainda por vencer.
A reforma dos mercados não ocorre no vácuo. Entre 2020 e 2022, Angola enfrentava o choque pandémico, uma recuperação económica hesitante e a necessidade urgente de diversificar fontes de financiamento. Foi neste cenário que o mercado de capitais emergiu como alternativa estratégica ao financiamento público tradicional e à intermediação bancária.
Enquanto Presidente da CMC, com mandato exercido entre 31 Julho de 2020 e 22 de Setembro de 2022, tive o privilégio de liderar um ciclo reformador que trouxe avanços estruturantes ao sector.
O mercado de capitais precisava deixar de ser periférico para se tornar um pilar funcional de financiamento económico. Em 2022, aprovámos o primeiro IPO da história de Angola, um marco que sinalizou maturidade institucional e abertura ao investidor individual e institucional.
O sucesso dessa operação representou mais do que um feito técnico: simbolizou confiança do emissor, dos investidores e do Estado, através do PROPRIV. Reformámos a estrutura de taxas aplicadas ao Mercado de Valores Mobiliários, aumentamos a capacidade de supervisão e lançamos projectos de educação financeira e de inclusão gradual das Pequenas e médias empresas no Mercado de capitais (Projecto Emergentes). Essas medidas, ainda que impopulares, foram essenciais para garantir a sustentabilidade da CMC.
Sem literacia financeira, não há crescimento sustentável. Em 2021, lançámos a primeira edição do concurso CMC & Universidades, conectando a academia ao mundo financeiro e promovendo pensamento crítico sobre mercados. Essa ponte gerou visibilidade institucional e formou uma nova geração técnica.
Expandimos o ecossistema: sociedades gestoras, correctoras, fundos, peritos avaliadores de imóveis, bancos e cidadãos começaram a ver o mercado como espaço de oportunidade económica. Contudo, os desafios permanecem e exigem respostas estratégicas.
Cinco frentes prioritárias foram elencadas (Agosto 2020 – Setembro 2022):
- Expansão do mercado para famílias e PMEs, com produtos acessíveis e linguagem simples.
- Aprofundamento do mercado secundário, com mais liquidez
- Transformação digital da supervisão com inteligência de dados e automação.
- Fortalecimento da independência institucional da CMC.
- Integração regional e cooperação internacional, especialmente com congéneres africanas.
É fundamental que o Executivo trate o mercado como instrumento de política pública, capaz de financiar infraestruturas e democratizar o acesso ao capital. A literacia financeira deve ser uma política educativa de base, com integração curricular e mobilização dos media.
Em 2022, promovemos o primeiro Fórum ESG em Angola. Sustentabilidade, governação e impacto social são já exigências globais. Angola deve alinhar-se a essa nova linguagem de mercado.
Os mercados não amadurecem com discursos, mas com instituições sólidas, regulação eficaz e actores comprometidos. Celebrar os 20 anos da CMC não deve ser apenas simbólico, é tempo de pensar o futuro com ambição africana, sofisticação técnica e ousadia ética.
Angola precisa de um mercado à altura da ambição africana e da sofisticação institucional que almeja. A próxima década deve ser marcada por uma agenda clara: ponderar a elaboração de um plano nacional de desenvolvimento do mercado de capitais que inclua os principais players, aprofundar a liquidez, fortalecer a confiança institucional e alinhar o mercado angolano com os fluxos globais de capital.