O Programa Económico de Apoio a Angola, do Fundo Monetário Internacional, veio impor a implementação de uma série de medidas, dentre as quais garantir maior solidez ao sector financeiro. Essas medidas incluem a adopção de legislação que vá de acordo com os padrões internacionalmente aceites. No âmbito do subsector de seguros, foi publicada, em 2022, a actual Lei da Actividade Seguradora e Resseguradora, que vem provocando alterações à legislação complementar, desde Decretos a Normas Regulamentares. No passado mês de Junho, foi publicado o novo Regime Jurídico da Mediação e Corretagem de Seguros, aprovado pela Lei n.º 6/24, de 3 de Junho.
Composto por sete capítulos e 96 artigos, o diploma regula tanto as condições de acesso e de exercício da actividade de mediação de seguros e de resseguros como as relações entre mediadores de seguros e as seguradoras. Quando comparado ao regime anterior, facilmente se depreende que o novo regime é mais completo e apto para lidar com os desafios dos tempos actuais, tendo trazido consigo distintos elementos inovadores, dos quais se destacam os seguintes:
Categoria de mediadores
Deixa de existir a figura do angariador, que é substituído pelo Mediador de Seguros a título acessório, passando, portanto, a considerar-se os (i) agentes de seguros, (ii) Mediadores de Seguros a título acessório e os (iii) corretores de Seguros.
Âmbito da actividade de mediação
Além dos ramos habituais, o novo regime instituiu a possibilidade de surgirem mediadores de (a) fundos de pensões, (b) produtos de micro-seguros e de (c) produtos de micro-pensões.
Instituições Financeiras Bancárias (IFB)
Este foi, certamente, um dos pontos mais discutidos durante o processo de consulta e aprovação, tendo-se levantado inúmeras reticências por parte do legislador e de alguns operadores de seguros por que se mostravam cépticos com a possibilidade de as IFB’s passarem a agir como mediadores de seguros. Até à entrada em vigor da actual lei, a intervenção das IFBs no sector de seguros resumia-se ao bancassurance, no âmbito de contratos dessa natureza celebrados com as seguradoras. No âmbito do actual regime, as IFB’s podem agora exercer a actividade de mediadores de seguros, na categoria de Agentes de Seguros, de pessoas colectivas e singulares, devendo, para o efeito, comunicar previamente ao Banco Nacional de Angola (BNA) e registar-se junto da Agência Angolana de Regulação e Supervisão de Seguros (ARSEG). Existe, entretanto, uma limitação no âmbito da actuação como mediador de pessoas singulares, que consiste no facto de os produtos de seguros distribuídos terem papel complementar de bens ou serviços por si prestados, no âmbito da sua actividade profissional principal, não podendo, entretanto, impor a celebração de contrato de seguro com uma determinada empresa de seguros como condição de acesso a outro bem ou serviço fornecido. Entendemos nós que essa última limitação visa minimizar ou até mesmo eliminar o risco de conflito de interesses, dada a existência de IFBs com participação no capital social de seguradoras.
Mediadores pessoas colectivas
Continua a ser exigido que estes adoptem a forma de sociedades por quotas ou anónimas, mas, ao contrário do que era previsto no regime anterior, que permitia que as acções fossem nominativas ou ao portador, foi eliminada a opção das acções ao portador.
Mediadores estrangeiros
Para o exercício da actividade de mediação, deixa de ser exigível que o cidadão estrangeiro seja residente em Angola há, pelo menos, cinco anos, mantendo-se, contudo, a obrigação de ter o estatuto de residente.
Controlo das participações qualificadas
O novo regime instituiu, relativamente aos corretores de seguros e aos mediadores de resseguros, um sistema de controlo dos detentores de participações qualificadas, por remissão à Lei da Actividade Seguradora e Resseguradora (Lei n.º 18/22, de 7 de julho), com as devidas adaptações, especificamente nos seus artigos 155.º a 160.º e 163.º. Além das situações de aquisição de participações qualificadas, ficam, igualmente, abrangidos os aumentos das participações a tal ponto que a percentagem de direitos de voto ou de capital do corretor de seguros ou mediador de resseguros atinja ou ultrapasse 50%.
Suspensão do registo
Surge a possibilidade de se suspender o registo do mediador de seguros, (a) a seu pedido, por período não superior a dois anos, (b) por incompatibilidade de funções superveniente, (c) pelo não exercício da actividade ou por se manter incomunicável por período igual a seis meses, e (d) a título de sanção acessória. Com a suspensão do registo do mediador, opera-se a transmissão automática dos contratos para as empresas de seguro que sejam parte dos mesmos.
Supervisão
Cabe à ARSEG a supervisão de todos os mediadores, independentemente da categoria em que se inserem, incluindo as IFBs, no que toca ao exercício da actividade de mediação.
Gestão de Reclamações
Os mediadores de seguros passam a estar obrigados a instituir uma função responsável pela gestão das reclamações dos tomadores de seguros, segurados, beneficiários e terceiros lesados relativos aos respectivos actos ou omissões, à semelhança das seguradoras.
Contraordenações
O novo regime apresenta três categorias distintas de contraordenações, a saber, (i) simples, (ii) graves e (iii) muito graves. Indica ainda que o procedimento contraordenacional prescreve quando tenham decorridos cinco anos contados da data da sua prática.
Importa referir que, apesar de previstas, distintas matérias fundamentais ficam dependentes de regulação por parte da ARSEG para que, efectivamente, sejam aplicadas.