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O tik tak do próximo passo de João Lourenço

Nelson Francisco Sul

16 Dezembro, 2024 - 10:31

Nelson Francisco Sul

16 Dezembro, 2024 - 10:31

Nesta segunda-feira (16), o MPLA, partido que suporta o Governo, vai reunir-se em Congresso Extraordinário, no Centro de Convenções de Belas, em Luanda. Este será, sem dúvida, o evento mais importante e aguardado nos últimos sete anos para o país político e económico. Está em causa a forma como Deng Xiaoping angolano deseja ser lembrado

NO DIA EM QUE, a partir de Londres, João Lourenço foi anunciado como “Líder Africano da Paz e Segurança do Ano 2024”, pela revista African Leadership Magazine, em Luanda decorriam os últimos acertos para a realização do congresso extraordinário do partido que suporta o Governo, do qual Lourenço é o presidente desde Setembro de 2018.

A bússola principal é a de que este congresso servirá para permitir que o actual líder, o “Deng Xiaoping” angolano, continue a comandar as “peças do tabuleiro” após o término do limite constitucional do seu mandato presidencial e executivo. Entretanto, o Presidente Lourenço já veio aterreiro dissipar os equívocos, lembrando, em primeiro lugar, que um “congresso extraordinário não é uma novidade na história do partido” e que os estatutos permitem que tais encontros sejam realizados “sempre que necessário, para revisões e ajustes fundamentais”.

Entretanto, ao entrar com a promessa de reformador, Lourenço pode ser apanhado no seu próprio anzol. Morrer pela boca, como peixe. Mas os próximos dois anos, exceptuando o ano eleitoral de 2027, serão cruciais para o seu capital político. Saber-se-á se palavra dada é palavra honrada.

No capítulo económico parecem ser inegáveis as reformas económicas que têm vindo a implementar, desde que se substituiu José Eduardo dos Santos como “inquilino” do Palácio da Colina de São José.

O seu compromisso com a transparência e reformas económicas levou-o, em primeiro lugar, a anular o concurso público internacional que atribuiu à Telstar a licença para quarta operadora de telecomunicações do país, tendo, mais tarde, sido substituído pela Africell.

O governo desenhou o PROPRIV, Programa de Privatizações, e inscreveu nele 163 activos. Destaque para alienação de parte das principais empresas do SEP (Sector Empresarial Público) e a privatização das participações detidas indirectamente pelo Estado no sector bancário e de seguros, por intermédio da Bolsa de Dívida e Valores de Angola (BODIVA), visando estimular o crescimento económico e garantir investimentos privados e estrangeiros para o País.

Destaque para a primeira venda, em leilão, do ex-banco estatal BCI (Banco de Comércio e Indústria), dando início ao funcionamento da Bolsa, em Dezembro de 2021.  No ano seguinte, dá-se a primeira privatização de activos estatais no mercado de acções na banca, alienando 10% do capital social que o Estado detinha no Banco Angolano de Investimentos (BAI), através da Sonangol e Endiama. Seguiram-se o Banco Caixa Geral Angola (BCGA), com uma oferta pública inicial de 25 por cento das acções detidas pela Sonangol e, muito recentemente, a ENSA e a BODIVA, que colocaram em bolsa 30% das suas acções.

Entre outros activos à venda em 2025, via Oferta Pública Inicial (IPO), ou seja, em Bolsa na BODIVA, estão as acções do Estado no Banco de Fomento Angola (BFA), UNITEL e no Standard Bank Angola.

Más notícias foram dadas a 25 de Outubro deste ano, pelo Grupo de Acção Financeira Internacional (GAFI), que voltou a incluir o nome de Angola na sua lista cinzenta, o que significa que o país fez muito pouco em matéria de combate ao branqueamento de capitais, financiamento do terrorismo e financiamento da proliferação de destruição de armas em massa. Na prática, esta decisão terá como consequência a redução da confiança de investidores estrangeiros, afectando a percepção do mercado sobre a segurança de se investir no país, levando à redução de entrada e saída de fluxos e elevando os custos de capital para empresas angolanas e o agravamento dos constrangimentos no sistema financeiro.

No capítulo macroeconómico, ao longo do período de oito anos, entre 2018 e 2025, as propostas do Orçamento Geral do Estado (OGE) formuladas pelo Presidente da República, na qualidade de Titular do Poder Executivo, têm evidenciado uma trajectória de expansão bastante considerável, com um valor médio anual de AOA 18,749 biliões.

Essa trajectória de crescimento do valor global do OGE foi interrompida apenas em 2021, ano em que o valor orçamentado registou uma inflexão, fixado em AOA 14,785 biliões, sinalizando, assim, uma anomalia no padrão de crescimento observado nos oito anos de presidência Lourenço.

A execução dos números constantes na ‘Folha de Excel’ que expressa as prioridades económicas e sociais do País, como saúde, educação, infra-estrutura, segurança, entre outras, tem-se mostrado um processo complexo, muito a quem do alinhamento das despesas do governo às suas metas de política pública, sustentabilidade fiscal e de desenvolvimento socioeconómico.

As taxas de execução dos orçamentos do Estado entre 2018 e 2024 (II trimestre), segundo cálculos feitos pelo o O Telegrama, atestam que a taxa média de execução orçamental foi de apenas 26,43%, ou seja, uma expressiva parte do orçamento neste período, equivalente a 73,57%, permaneceu não executada. Um desempenho que afacterá, sem dúvida, o saldo da governação dos dois mandatos de João Lourenço.

Perante a complexidade dos desafios políticos e económicos que se aproximam nos próximos três anos, depois de uma conturbada reeleição em 2022, o congresso extraordinário do MPLA, que terá lugar entre hoje e amanhã, não apenas ditará a reconfiguração do posicionamento político do partido do governo e do actual presidente.

Martin Wolf, jornalista britânico e principal analista económico do jornal Financial Times, disse certa vez: “Não sabemos como será o futuro. Mas sabemos como devemos tentar moldá-lo”.

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Nelson Francisco Sul

Director

Nasceu em Benguela, cursou Direito, mas apaixonou-se pelo Jornalismo. Desde então, esteve sempre inclinado em jornalismo político e investigativo. Foi correspondente na Deutsche Welle, emissora internacional da Alemanha, e no Expresso, o principal jornal de informação generalista de Portugal. Em Angola, conta com passagens em diversos órgãos, destacando o extinto Semanário Angolense e o jornal económico Expansão. Até fundar o O Telegrama, Nelson prestou consultoria em duas agências britânicas de classificação de risco de crédito e de risco reputacional de negócios.

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