A produção estatística oficial, em particular os dados derivados dos censos populacionais e da habitação, constitui uma base imprescindível para o desenho, implementação e avaliação de políticas públicas. A publicação periódica e atempada destes dados é um imperativo técnico e institucional que sustenta a racionalidade económica e a boa governação. Sem dados confiáveis, actualizados e acessíveis, o processo de formulação de políticas transforma-se num exercício de suposições, frequentemente descolado da realidade concreta das populações.
O censo populacional é a única operação estatística capaz de oferecer um retrato exaustivo da população de um país em determinado momento. Ele permite não apenas conhecer o número de habitantes mas também a sua distribuição geográfica, composição por idade e sexo, estrutura familiar, padrões de migração, níveis de instrução, ocupação, condições de habitação, entre outros aspectos sociais e económicos.
Estas informações são vitais para a determinação da base de alocação de recursos públicos (escolas, hospitais, infraestruturas), o planeamento urbano e habitacional, a formulação de políticas de emprego e protecção social e a definição de metas de desenvolvimento a nível local e nacional.
A ausência de dados censitários actualizados e disponíveis em tempo útil compromete, em condições normais, a capacidade do Governo em responder de forma eficiente às necessidades da população. Sem dados recentes, as projecções macroeconómicas tornam-se imprecisas, dificultando o planeamento fiscal, orçamental e monetário.
O segundo Recenseamento Geral da População e da Habitação teve início dia 19 de Setembro de 2024. Este censo foi particularmente importante porque, além de recolher dados demográficos, incorporou um conjunto mais amplo de indicadores socioeconómicos, alinhando-se às melhores práticas internacionais.
Adicionalmente, o Recenseamento Geral da População e da Habitação de 2024 em Angola teve um custo superior a 33,6 mil milhões de kwanzas. Este montante inclui, entre outros, a aquisição de 239 viaturas por 9,2 mil milhões Kz e 60.540 tablets por 23,2 mil milhões Kz. Outrossim, o Banco Mundial disponibilizou 60 milhões de dólares para apoiar o projecto, que também conta com assistência técnica do Fundo das Nações Unidas para a População (FNUAP), segundo cálculos do Jornal Expansão.
No entanto, passados sete meses desde a data de início da operação censitária, o Instituto Nacional de Estatística de Angola (INE) ainda não disponibilizou os resultados provisórios, apesar de José Calengi, técnico do INE, ter afirmado, a 12 de Setembro de 2024, durante a 16.ª edição do CaféCIPRA que, “do ponto de vista preliminar e pelo facto de estarmos a falar de uma operação digital, nós poderemos ter os dados preliminares quatro meses depois e, até aos 18 meses, teremos o primeiro relatório”.
Uma vista ao site do INE na internet, não há mensão sobre o calendário de publicações para 2025. Esta situação levanta preocupações legítimas quanto à capacidade de resposta estatística e à valorização do conhecimento empírico na gestão pública.
Os manuais internacionais e as boas práticas estatísticas, particularmente aquelas promovidas pelas Nações Unidas (ONU) e pelo Fundo das Nações Unidas para a População (UNFPA), recomenda que o calendário de disseminação inclua resultados preliminares até 3 meses após a operação de campo, e resultados definitivos entre 12 e 18 meses depois, dependendo da complexidade dos dados e dos recursos tecnológicos disponíveis.
A publicação periódica e atempada dos dados do censo populacional é mais do que um acto técnico, é um compromisso com a transparência governativa e, acima de tudo, com o bem-estar das populações. Em contextos como o de Angola, onde as necessidades de desenvolvimento são urgentes e os recursos limitados, este compromisso adquire um valor ainda mais estratégico.
Urge, pois, fortalecer a capacidade institucional para que os dados recolhidos não se percam no tempo, mas que se transformem em conhecimento útil para a acção. Um censo que não produz dados utilizáveis, em tempo útil, representa uma oportunidade perdida para o país.